aí você subitamente se apaixona por uns certos números que têm personalidades marcantes.

você simplesmente não sabe do que eu estou falando.

você transpira. você abre seus poros.

você lambe as curvinhas de um 3.

delírios oitavos…. 8888888.

você nunca vai entender.

unhas vermelhas, um copo de conhaque.

roda, roda, roda, roda e pára.

você nunca ganha.

o dinheiro passa em bandejinhas lindas. inox. prata. ouro.

você nunca quer o dinheiro.

você quer o poder do grito.

o murro na mesa.

as cartas que voam.

as fichas coloridas.

você tem olheiras.

você sempre acredita que tudo pode mudar.

você se belisca, se morde, se arranha, você se ama.

o barulho é sempre o mesmo, mas é sempre novo.

você nunca tremeu na vida, até então. você treme.

você quase não se lembra da senha.

você ainda tem dinheiro.

você nem sempre tem dinheiro.

a mesa é verde vida.

suas tripas se contorcem.

você nunca teve rins.

as pessoas brilham seus sorrisos limpos de culpa.

você já ouviu falar em sorte?

você tem sorte?

fala!!!

você nunca viu sorte na sua vida…

mais conhaque!

você fuma, mon cher?

a fumaça é assim… desenhista das conturbações da alma.

é agora que você vai ganhar. eu tenho certeza.

porque me dizem aqui baixinho.

quem diz?

como assim quem diz?

ele diz.

você vai sofrer a dor de ver aquele pequerrucho transluzir seu lucro.

doce engano de vida minha.

você não ouve ele falando no teu ombro?

todo mundo conhece ele.

ele é o homem mais lindo do mundo.

que? eu estou bem…

me deixe aqui.

ainda é tempo de… qual nada!

bêbado é quem te botou no mundo… me largue.

me largue que ainda vou ganhar.

aposto cem no 33.

torce, diabo!

parece que tá morrendo…!

 


Publicado na antologia de contos Contos da Terra, Contos da Garoa, em São Paulo, 2006.