Rua Mendes do Amaral.
Uma casinha para se morar.
Uma barriga imensa.
Um monte de cabelo seco na cabeça.
Um salário para se gastar.
Uma aliança de latão.
um batom cor-de-boca.
O SUS ali do lado.
uma televisão colorida.
uma antena meio bêbada.
tudo a seu tempo.
três camisas no varal.
um pente fino bege.
uma pia desentupida.
um fogão de 4 bocas.
Meu tapete, feito a mão.
uma foto amarelecida.
dois dentes quebrados na boca.
um esmalte que descasca.
um chinelo debaixo da cama.
o outro ali perto da porta.
O R.G. todo amassado.
Uma janela sem cortina.
A prestação da Pernambucanas.
um cachorro com o coto alegre.
um leite-de-rosas, pela metade.
uma penteadeira velha.
um azulejo quebrado.
um berço vazio.
um nome.
Murilo.
uma cueca de molho no omo.
um verde balde sem o puxador.
um telefone a ser instalado.
uma linha econômica.
porque agora é família.

a vida é tão boa quando a luz do sol brilha assim no assoalho…

 


Publicado na antologia de contos Contos da Terra, Contos da Garoa, em São Paulo, 2006.