Por volta de 1925, Fernando Pessoa escreveu, em inglês, um guia para estrangeiros deslocarem-se de modo prático pela cidade de Lisboa. A publicação, contudo, chamou a atenção mais pela aparente falta de linguagem literária do que pela apresentação da cidade em si. Desta forma, foi a ele reservado apenas as prateleiras de viagens das livrarias, apesar de seu sedutor diferencial: a assinatura de Fernando Pessoa.

Nesse guia, o escritor, que entendia Lisboa como seu lar, apresenta caminhos para a leitura de sua obra. Um guia para viajantes, sim, porém uma espécie de ritual de iniciação para a futura leitura poética. Indicações de itinerários que bem podem ser anúncios dos percursos da heteronímia e também de seus próprios passos por Lisboa, estabelecida assim como uma cidade literária.

“Fernando Pessoa e outros pessoas” talvez tenha, guardadas as devidas dimensões, essa mesma pretensão: a de conduzir o jovem leitor de Pessoa à obra intrincada e complexa desse escritor maior da língua portuguesa. Obra repleta de ruas e avenidas que se estabelecem a cada nova leitura, a cada novo encontro do olhar. Se Lisboa pode ser um tabuleiro para Pessoa e para seus leitores, a partir dos versos e da prosa de seus heterônimos principais (os outros pessoas – Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Alberto Caeiro, Bernardo Soares), a linguagem das HQs pode gerar ainda outros espaços. Novas viagens para novos viajantes ou para velhos marinheiros saudosos dos atracadouros do Tejo, sedentos por revisitar Lisboa.