Estreia de Hilda Hilda, o livreto de poesia foi publicado pela primeira vez na Revista dos Tribunais, em 1950.

Ilustrações de Darcy Penteado


Poemas Primeiros / À minha mãe

XII
Dia doze… e eu não suportarei
o estado normal das cousas.
O ano que vem, não vou desejar
felicidades a ninguém.

Nem bom natal, nem boas entradas.

Meus amigos sabem de tudo o que eu sei.
E continuam a viver sem iterrupção,
apressadamente como no ato do amor.
São doidos e não percebem que amanhã
Cristina não virá.
Que amanhã Cristina vai morrer
porque ama a vida.

Amanhã serei corajosamente Cristina.
Eu, amando todos os que sofrem.
Eu… essência.

Mas os meus amigos, coitados,
não percebem.
Fazem filhos nascer, fazem tragédia.
Não sabem que o amor não é amor
e a natureza é um mito.

Não sabem de nada os meus amigos.
E não vou explicar
porque podem ficar sentidos.
São puros, vão morrer como anjos.
Vão morrer sem nada saber
daqueles dias perdidos.

Vão morrer sem saber que estão morrendo.


Hilda de Almeida Prado Hilst (Jaú, 1930-2004) foi uma poeta, ficcionista, cronista e dramaturga brasileira. É considerada pela crítica especializada como uma das maiores escritoras em língua portuguesa do século XX. Seu trabalho aborda temas como misticismo, insanidade, erotismo e libertação sexual feminina. Hilst foi fortemente influenciada por James Joyce e Samuel Beckett, e essa influência aparece em temas e técnicas recorrentes em seus trabalhos como o fluxo de consciência e realidade fraturada.