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O cavaleiro inexistente

Italo Calvino

Nessa espécie de romance de cavalaria às avessas, Italo Calvino põe em marcha toda a sua habilidade construtiva e capacidade alegórica, mas também a sua verve humorística, para contar as aventuras e desventuras de Agilulfo Emo Bertrandino dos Guildiverni e dos Altri de Corbentraz e Sura, o cavaleiro inexistente da corte de Carlos Magno. Circundado por uma galeria de personagens que compõem um verdadeiro exército brancaleônico, Agilulfo serve com fé a causa da cristandade. De permeio, tem de lidar com uma querela em torno de sua nobre reputação, espelhada na armadura trazida sempre imaculadamente alva, embora paradoxalmente vazia. Como nos demais romances da trilogia Nossos antepassados, Calvino mergulha nos tempos heróicos da cavalaria medieval, vistos aqui em chave burlesca, utilizando como narrador uma freira confinada no convento, cuja penitência é justamente escrever a história desse cavaleiro sui generis. Afinal, como nos lembra O cavaleiro inexistente, só se pode ser senhor gerente de tudo a própria pessoa que for vazia e sem substância.

“Como era possível aquele fechar de olhos, aquela perda de consciência de si próprio, aquele afundar num vazio das próprias horas e depois, ao despertar, descobrir-se igual a antes, juntando os fios da própria vida, Agilulfo não conseguia saber.”


Italo Calvino 🇮🇹 (1923—1985) formado em Letras, iniciou o curso de Agronomia, mas abandonou e foi participar da resistência ao fascismo durante a II Guerra Mundial. Depois conheceu diversos militantes comunistas, passou a trabalhar no jornal L’Unità e na editora Einaudi. Foi membro do Partido Comunista Italiano até 1956, tendo se desfiliado um ano depois. A sua carta de renúncia ficou famosa. Sua primeira obra foi Il sentiero dei nidi di ragno (1947). Uma de suas obras mais conhecidas é Le città invisibili (1972). Por que ler os clássicos?

Pedro Páramo

Juan Rulfo

Pedro Páramo é o único romance do escritor mexicano Juan Rulfo, publicado em 1955. É o segundo livro de Rulfo, seguindo-se a El llano en llamas.

A obra é considerada um dos melhores e mais influentes romances da literatura hispano-americana, tendo recebido elogios de escritores como Jorge Luís Borges, Gabriel García Márquez, Carlos Fuentes, Octavio Paz, Günter Grass e Susan Sontag. Apesar dos críticos terem reconhecido prontamente as qualidades do livro, que recebeu o Prêmio Xavier Villaurrutia daquele ano, a recepção do público foi fraca: dos 2000 exemplares da primeira edição, apenas 1000 foram vendidos.

A trama se passa na cidade de Comala, no estado de Colima. Sobre a época, há indicações de ser contemporânea à Revolução Mexicana e à Guerra Cristera. Alguns membros da família de Rulfo fora vítimas da violência revolucionária cujo epicentro foi seu estado natal de Jalisco, e assim seus escritos frequentemente remetem a ela.

A história é narrada em uma mistura de primeira e terceira pessoas, com alternância dos personagens na voz da primeira pessoa. Não há capítulos, e sim uma infinidade de fragmentos, que não seguem uma sequência temporal. O caráter de Pedro Páramo é deslindado pouco a pouco pelo autor por meio desses discursos múltiplos, fragmentados, desordenados e muitas vezes contraditórios.

A linguagem é direta e enxuta, e abundam os regionalismos nas falas dos personagens. Pode ser considerado tanto um romance regionalista quanto um pertencente ao gênero do Realismo mágico, pois o texto, que começa no primeiro estilo, vai paulatinamente transformando-se no segundo, à medida que a verdade se desvela a respeito de Pedro Páramo e da cidade de Comala. A estrutura intrincada e inovadora é provavelmente a responsável pela resposta inicial negativa dos leitores, mas assegurou o perene renome e a influência da obra sobre os escritores latino-americanos.

O livro deu origem a várias adaptações para o cinema.

“Alguma vez você ouviu o queixume de um morto?” — Juan Rulfo


PERSONAGENS

  • Pedro Páramo – Homem cruel e inescrupuloso que se tornou a pessoa mais importante de Comala.
  • Dolores Preciado – Legítima esposa de Pedro Páramo, suas palavras entremeadas no texto sugerem que, no tempo em que morava em Comala, o lugar era alegre e fértil.
  • Juan Preciado – Único filho legítimo de Pedro Páramo, que, no entanto, não o registrou.
  • Abundio Martínez – Arrieiro, um dos filhos ilegítimos de Pedro Páramo, e primeira pessoa de Comala que Juan Preciado encontra. Após a morte da esposa, Refugio, embebeda-se e sai pela cidade pedindo ajuda para enterrá-la. Ao encontrar o pai, mata-o.
  • Eduviges Dyada – Amiga de Dolores Preciado, hospeda Juan Preciado em sua casa. Segundo afirma, havia sido avisada da chegada dele pela mãe agonizante. Na noite de núpcias de Dolores, a pedido desta, substituiu-a na cama. Suicida-se.
  • Susana San Juan – Eterno amor de Pedro Páramo, mas que se casa com Florentino e se muda da cidade. Volta após ficar viúva, mas está louca de dor. Odeia o pai devido a um episódio ocorrido na mina de Andromeda durante sua infância.
  • Don Bartolomé San Juan – Pai de Susana, volta com ela a Comala após a morte do marido. Opõe-se ao seu casamento com Pedro Páramo, por isso é morto a mando deste.
  • Miguel Páramo – Filho bastardo de Pedro Páramo, que inicialmente o renega mas, por insistência do padre, acaba por reconhecê-lo. Tem o caráter do pai, que sempre assume a responsabilidade por seus crimes e abusos. Morto em um acidente durante uma cavalgada.
  • Padre Rentería – Pároco local, encarna a corrupção da Igreja, pois atende a todos os caprichos dos poderosos. Em função disso, tem sua autoridade para absolver os moribundos removida pelos superiores, o que faz com que os mortos de Comala nunca descansem.
  • Dorotea – Louca que vivia da caridade pública, conseguia mulheres para Miguel Páramo. É enterrada junto a Juan Preciado, no mesmo caixão.
  • Damiana Cisneros – Outra amiga de Dolores Preciado, trabalhadora na fazenda Meia Lua.
  • Damasio Tilcuate – Jagunço de Pedro Páramo, que este converte en falso revolucionário de maneira a mantener protegidas suas terras.
  • Fulgor Sedano – Administrador da fazenda de Pedro Páramo, ajuda-o a executar suas decisões, de pedir a mão de uma mulher a negociar uma dívida ou matar um homem. Morto por um grupo de revolucionários.
  • Justina Díaz – Ama de Susana San Juan.
  • Gerardo Trujillo – Advogado devotado de Pedro Páramo. Ao decidir mudar-se para outra cidade, após muitos anos de serviços prestados, ele não reconhece os seus serviços e ele é obrigado a voltar para trás e a pedir-lhe dinheiro para se estabelecer em outra cidade, dizendo que vai continuar a tratar dos seus “assuntos”.
  • Toribio Alderete – Fazendeiro vizinho de Pedro Páramo, morto por este para ter sua propriedade incorporada à fazenda Meia Lua.
  • Doutor Valência– Médico