O Ano do Pensamento Mágico foi finalista do Pulitzer e levou o National Book Award em 2005. É com ele que Joan Didion faz sua viagem pela memória do ano mais transformador da sua vida, começando na noite em que o marido, o escritor John Dunne, com quem foi casada por 40 anos, morre de ataque cardíaco, e a sua única filha está em coma na UTI de um hospital.

“o que eram seus olhos agora são pérolas.”

Com uma escrita tão assertiva como limpa, tão honesta como desarmante, Didion investiga os vivos que sobrevivem aos mortos, revelando, através da sua experiência pessoal, aquilo que é universal a todos: a dor da perda, a necessidade da superação quando tudo parece inútil, numa escuridão impenetrável.

“no colapso de uma estrela morta que dá lugar a um buraco negro.”

Num registo por vezes jornalístico, recorrendo a estudos, especialistas ou a poemas e obras de arte, outras vezes confessional e literário, mas escapando da autopiedade, Didion deixa o fluxo da sua consciência viajar pelas memórias do casamento, pela experiência da maternidade e da escrita, recordações que emergem a cada momento, quando trata do funeral do marido ou visita a filha inconsciente no hospital. Ela fala uma pouco do luto normal e do luto patológico. e também tem uma passagem interessante em que ela diz que os enlutados estão como expostos, em carne viva.

“Entendi pela primeira vez o poder da imagem dos rios,
o Estige, o Lete, o barqueiro com sua capa e sua vara.”

Freud descreveu o luto em Luto e melancolia, como “apego ao objeto por intermédio de uma psicose alucinatória cheia de desejo”, algo que compete à inexorabilidade aleatória de um sonho.

“a ausência infindável que se segue, o vazio, o oposto do sentido, a sucesão implacável de momentos durante os quais vamos nos confrontar com a própria experiência da ausência de sentido.”


“e o que eu quero saber é
o que achou do seu menino de olhos azuis
Senhor Morte”

E. E. Cummings


uma única pessoa está usente, mas o mundo inteiro parece vazio.

Phillipe Ariès em História da morte no Ocidente.


o tempo é a escola na qual aprendemos
o tempo é o fogo no qual ardemos

Delmore Schwartz


Com tais fragmentos foi que escorei minhas ruínas

Tradução de Ivan Junqueira, in: T.S. Eliot, Obra completa – volume I: Poesia. São Paulo: ARX, 2004.

East Coker de T.S. Eliot

“Pois apenas se aprendeu a escolher o melhor das palavras
Para o que não há mais a dizer,
ou o meio pelo qual
Não mais se está disposto a fazê-lo”


poema de Gerard Manley Hopkins

“Ah! a mente tem montanhas; precipícios, vias
Terríveis, que ninguém trilhou. Se alguém duvida
É que nunca as buscou.
Desperto. Um travo dói, de treva, não de dia.
Pedi para ficar
Onde o vento não ouse.”

Tradução de Augusto de Campos, in: Hopkins: A beleza difícil. São Paulo: Perspectiva, 1997.


Outras citações

  • diário que C. S. Lewis manteve após a morte de sua mulher: Anatomia de uma dor: um luto em observação
  • Catulo – “Na morte de seu irmão
  • uma passagem de Hermann Castorp de A Montanha Mágica de Thomas Mann
  • Matthew Arnold – “The Forsaken Merman
  • W. H. Auden nos versos de “Funeral Blues” da peça The Ascent of F6
  • elegia Rose Aylmer de Walter Savage Landor
  • o livro de etiqueta de Emily Post, Funerals
  • Geoffrey Gorer – Death, Grief and Mourning
  • Caitilin, viúva de Dylan Thomas – Leftover Life to Kill

Joan Didion 🇺🇸 (1934-2021) norte-americana, nasceu em Sacramento, foi autora de romances, obras de não-ficção, peças de teatro e filmes. O seu estilo jornalístico, que o New York Times descreveu como “elegante, sofisticado e irônico”, fez dela uma das vozes literárias que melhor revelou a identidade da América do seu tempo. O Ano do Pensamento Mágico foi finalista do Prémio Pulitzer e valeu-lhe o National Book Award em 2005. O livro foi adaptado ao teatro e a peça estreou na Broadway em 2007.