O Avesso e o Direito é o primeiro livro de Albert Camus, escrito quando o autor tinha apenas 22 anos. Foi publicado ainda na Argélia, em 1937, com a tiragem muito discreta de 350 exemplares. Só em 1958, quando o autor já se tinha tornado uma celebridade, é que o livro seria reeditado, desta vez em França acrescentando, em um prefácio maravilhoso, suas justificativas. E contudo, este livro impregna toda a restante obra de Camus. Estão aqui presentes o fascínio da luz e da felicidade, as primeiras suspeitas do absurdo (“toda a absurda simplicidade do mundo”), os temas do silêncio, da mãe, da indiferença mas também do amor, que irão perpassar ao longo de todos os seus outros livros, e também de muitas das suas reflexões.

Sobre O Avesso e o Direito Camus afirma haver uma certa imaturidade na obra, mas também declara que “Há mais amor verdadeiro nestas páginas do que em todas as que se seguiram”. Esta não é só a obra inicial de Camus, é princípio e fim em si mesma, pois o autor já revela aqui sua visão de mundo e sobre si mesmo.

“Não há amor de viver sem desespero de viver”

Camus é profundo em sua simplicidade. Os 5 ensaios literários que compõem o livro nos apresentam as principais temáticas camusianas: a solidão, a paixão pelo clima mediterrâneo, a reflexão sobre a condição humana e sobre a vida e a morte e o exílio.

O primeiro ensaio intitula-se A Ironia. É uma reflexão sobre a morte e o abandono, onde o autor fala ao mesmo tempo da juventude e da velhice. Uma mulher velha e carente, que clama pela atenção de seus próximos, é trocada por uma sessão de cinema e um velho convive com jovens, vivendo a ilusão de que recuperará a juventude perdida com eles.

Entre o Sim e o Não é um ensaio de raízes autobiográficas no qual Camus volta à sua infância e fala sobre a necessidade da simplicidade. Entre a solidão e o passado, é necessário um desapego: Num certo grau de despojamento, nada mais leva a mais nada, nem a esperança nem o desespero parecem justos, e a vida inteira resume-se a uma imagem. Camus  defende que se viva com realismo e sinceridade e se os homens tornam o mundo difícil, é nossa missão restaurar a sua simplicidade original.

Em a Morte na Alma o autor trata do tema do exílio e da solidão da viagem. Em Praga, entregue a momentos de tédio e de rotina, Camus  pondera sobre o sentimento de distância e as saudades de casa. Como viver, como encontrar paz, quando tudo o que há são rostos estranhos e placas cujo significado se desconhece?

Amor pela Vida também fala sobre viagens, mas de um ponto de vista mais estético. Camus  fala de esculturas, de claustros góticos, do verde da tarde e de colinas que deslizam para o mar. Há um certo amor perdido em tudo isso; o amor que habita na arte e que também se pode encontrar na natureza. Depende da disposição da alma ser capaz de encontrá-lo, desvendá-lo e alcançá-lo.

Por fim, o ensaio que dá nome à obra. O Avesso e o Direito fala sobre uma mulher que se apega de tal modo ao seu próprio túmulo que acaba por morrer aos olhos do mundo. Nada mais comum; vivemos numa sociedade de mortos que, por orgulho ou egocentrismo, são incapazes de desviar os olhos de si mesmos para contemplar a vida. A vida é curta, e é um pecado perder tempo, diz Camus . O que conta é ser humano e simples. E acrescenta: Não há amor de viver sem desespero de viver.