cor de afogamento

Emil M. Cioran

Todas as águas são cor de afogamento.

In: CIORAN, Syllogismes de l’Amertume (1952)
Silogismos da Amargura
, tradução de Manuel de Freitas, ed. Letra Livre (2009)

A Chalupa, Amadeo de Souza-Cardoso | O prazer das cores intensas, capazes de emprestarem expressividade às obras. De Henri Rousseau, da geração francesa anterior à dos dois Amadeus, o pintor português absorve a paixão por temas naturalistas, de realidades simples e que progressivamente o aproximaram do abstracionismo. No seu programa ideológico, Amadeo juntou estas duas influências em vários trabalhos sobre o mar e os Descobrimentos Portugueses. As embarcações perdem-se na imensidão dos oceanos, metáfora de vários períodos da vida do artista amarantino. Em “A Chalupa”, as vagas transformam-se em montanhas azuis que tudo consomem.


Emil M. Cioran 🇷🇴 (1911 — 1995) foi um escritor e filósofo romeno radicado na França. Em 1949, ao publicar “précis de decomposition”, passa a assinar E.M. Cioran, influenciado por E.M. Forster — esse “M” não tem nenhuma relação com outros nomes do filósofo (como Michel, Mihai, etc.) Um dos melhores conhecedores da obra de Cioran é o filósofo espanhol Fernando Savater, um de seus mais importante livros adentrando no pensamento de Cioran é Ensayo Sobre Cioran, de 1974. Ambos eram próximos e o livro termina numa entrevista com o filósofo romeno, mostrando um pouco de seu lado pessoal. Principais interesses: antinatalismo, misantropia, suicídio. Trabalhos notáveis: Breviário de Decomposição, Silogismos da Amargura, Exercícios de Admiração.


Amadeo de Souza-Cardoso 🇵🇹(1887-1918) primeira geração de pintores modernistas portugueses, destaca-se pelo diálogo que estabeleceu com as vanguardas históricas do início do século XX. O artista desenvolveu, entre Paris e Manhufe, a mais séria possibilidade de arte moderna em Portugal num diálogo internacional, intenso mas pouco conhecido, com os artistas do seu tempo. Articula-se de modo aberto com movimentos como o cubismo o futurismo ou o expressionismo, atingindo em muitos momentos, um nível em tudo equiparável à produção de topo da arte internacional sua contemporânea.

caricaturas emméricas

Amadeo de Souza-Cardoso

“O que há de horrendo, nesta vida, é que nada foge à caricatura,
nem a própria Divindade!”

Teixeira de Pascoaes
In: A Saudade e o Saudosismo. Lisboa, Assírio & Alvim, 1988, p.221

Numa visita ao Museu do Prado, em Madrid, Amadeo ficou impressionado com Los Borrachos, óleo de Diego Velázquez, pintado entre 1626 e 1628. Em farras com os amigos de Paris, o pintor (que mostrou sempre uma veia teatral) encenou uma reconstituição do quadro, em 1908. Amadeo posa como Baco. Pedro Cruz ajoelha-se perante a divindade. Domingos Rebelo representa de tronco nu o lado divino, ao passo que cabe a Emmérico Nunes e Manuel Bentes o papel de replicar os dois bêbedos à direita de Amadeo.

 

A caricatura tem a sua origem na tragédia mais íntima da Vida.
Foi Deus que a inventou, a fim de quebrar a infinita monotonia da Identidade originária, do Mesmo, esse deserto sem limites. Quando os Outros pulularam do Mesmo, logo se fez aquele riso de ironia que vai do sorriso discreto das estrelas à gargalhada olímpica do Sol.

Teixeira de Pascoaes
In: A Saudade e o Saudosismo. Lisboa, Assírio & Alvim, 1988, p.182


Teixeira de Pascoaes 🇵🇹(1877-1952), pseudônimo de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos, nascido em Amarante, foi um poeta, escritor e filósofo português e um dos principais representantes da Renascença e do Saudosismo. De família da aristocracia rural, foi uma criança introvertida e sensível, propensa à contemplação nostálgica. Em 1901 se forma em Direito pela Universidade de Coimbra, mas não participa da boemia coimbrã, passando o seu tempo, monasticamente, no quarto, a ler, a escrever e a refletir. Teve muitos contatos no exterior e foi um bibliografista notável. Publicou, entre outros, O Doido e a Morte (1913), Elegia da Solidão (1920), Versos Pobres (1949). 


Amadeo de Souza-Cardoso 🇵🇹(1887-1918) primeira geração de pintores modernistas portugueses, destaca-se pelo diálogo que estabeleceu com as vanguardas históricas do início do século XX. O artista desenvolveu, entre Paris e Manhufe, a mais séria possibilidade de arte moderna em Portugal num diálogo internacional, intenso mas pouco conhecido, com os artistas do seu tempo. Articula-se de modo aberto com movimentos como o cubismo o futurismo ou o expressionismo, atingindo em muitos momentos, um nível em tudo equiparável à produção de topo da arte internacional sua contemporânea.


Emmérico Nunes 🇵🇹(1888 – 1968) de ascendência portuguesa e alemã, sua vida e obra são fortemente marcadas pela sua condição de artista entre duas pátrias. Um dos caricaturistas que maior fama europeia alcançou, e sobre o qual pesa hoje um imerecido esquecimento, ilustra o que a língua latina resume em duas palavras: Fama? Fumus. Com uma vastíssima obra gráfica, dispersa por jornais, revistas, magazines e publicações infantis, distinguiu-se como humorístico, caricaturista e ilustrador. À imaginação hilariante seus cartoons políticos, as suas galerias de retratos e de tipos sociais, de grande força plástica e graça endiabrada.

Quem sonha é um lar aceso

Teixeira de Pascoaes

“Há dois modos de escrever aforismos: ou por ordem expressa, logo os mostrando, ou de forma secreta, não visível, ocultando-os. Teixeira de Pascoaes é um escritor de aforismos ao segundo modo…”, da contracapa. A seleção e apresentação é de António Cândido Franco, edição de 2022. A imagem da capa é de António Areal, Pascoaes (1977)

As cousas revelam-se na memória, bem melhor que à luz do sol. A memória é interior prolongamento dos sentidos; está, por isso, em íntimo contacto com a realidade. Só ela conhece a realidade. Só existe o que nela se fixar. Se me recordo dum sonho, é que ele existe, como qualquer nuvem ou penedo.


Teixeira de Pascoaes 🇵🇹(1877-1952), pseudônimo de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos, nascido em Amarante, foi um poeta, escritor e filósofo português e um dos principais representantes da Renascença e do Saudosismo. De família da aristocracia rural, foi uma criança introvertida e sensível, propensa à contemplação nostálgica. Em 1901 se forma em Direito pela Universidade de Coimbra, mas não participa da boemia coimbrã, passando o seu tempo, monasticamente, no quarto, a ler, a escrever e a refletir. Teve muitos contatos no exterior e foi um bibliografista notável. Publicou, entre outros, O Doido e a Morte (1913), Elegia da Solidão (1920), Versos Pobres (1949).