Do inconveniente de ter nascido compõe um dos textos-chave do trabalho de Emil Cioran, esses aforismos, escritos em seu estágio de maturidade, condensam seus pensamentos tão laconicamente, são tão eficazes e coerentes, que constituem uma descoberta decisiva para todos os amantes do paradoxo e da ironia. Esculpidos com precisão, falam do tempo, de Deus, da religião, do silêncio, da morte e do nascimento: “uma coincidência, um acidente risível”. Neles vivem uma lucidez devastadora, um humor sem limites e a lógica mais abrumadora, juntamente com a maior contradição. Oposta ao otimismo e à complacência de forma radical, Cioran não desencoraja, tem o talento para fortalecer.

“Deveríamos repetir a nós próprios todos os dias: Sou um daqueles que, entre milhares, se arrastam pela superfície do globo. Essa banalidade justifica qualquer conclusão, qualquer comportamento ou acto: deboche, castidade, suicídio, trabalho, crime, preguiça ou rebelião. …E daí se conclui que todos nós temos razão em fazer o que fazemos.”

Tradução de Manuel de Freitas e edição da Letra Livre

De l’inconvénient d’être né (1973)


Emil M. Cioran 🇷🇴 (1911 — 1995) foi um escritor e filósofo romeno radicado na França. Em 1949, ao publicar “précis de decomposition”, passa a assinar E.M. Cioran, influenciado por E.M. Forster — esse “M” não tem nenhuma relação com outros nomes do filósofo (como Michel, Mihai, etc.) Um dos melhores conhecedores da obra de Cioran é o filósofo espanhol Fernando Savater, um de seus mais importante livros adentrando no pensamento de Cioran é Ensayo Sobre Cioran, de 1974. Ambos eram próximos e o livro termina numa entrevista com o filósofo romeno, mostrando um pouco de seu lado pessoal. Principais interesses: antinatalismo, misantropia, suicídio. Trabalhos notáveis: Breviário de Decomposição, Silogismos da Amargura, Exercícios de Admiração